quinta-feira, 24 de novembro de 2011

A repetição

« Enterra-se um  dedo no solo para cheirar em que terra se está; eu enterro o dedo na existência - ela não cheira a coisa nenhuma. Onde é que eu estou? Que significa dizer: mundo?»
K.


Poucas perguntas me fazem pensar muito. Já poucas coisas me fazem pensar muito – escreveria eu assim, depois. Na verdade, sinto que cada vez que passa um dia (e um dia só acontece uma vez), as possibilidades de me esvair no pensamento comum, se tornam latentes. Latente é uma palavra que sempre me fez pensar em impulso e esta em Freud. Aos oito anos, eu pensava que a palavra impulso tinha um cariz puramente sexual e como tal, assumi que era uma espécie de palavra maldita. A psicologia é como outra coisa qualquer. Quero com isto dizer que, tal como a religião, o voluntariado, o sexo, o amor, a praia, a arte, a zara, o espiritismo, o sushi, a procriação, o dinheiro, a cultura, o cabeleireiro, os filhos,  as meias de lã, também a psicologia, coitada, se constitui como uma estratégia de fuga. O problema do Reich é mesmo esse: quando não queremos fugir. Parece-me legítimo que a desistência do labirinto seja saudável se com isto se concluir que não há nem nunca houve qualquer labirinto mas um impulso absurdamente humano, de caos. O verdadeiro cansaço que algumas pessoas me causam concentra-se na facilidade com que se me apresentam desprovidas de qualquer interesse refutativo e se assemelham, ao mesmo tempo, a indivíduos sem cor, com coração de betão. Tem certa graça, gente assim. A minha disposição oscila entre alguma simpatia humana e a tentativa, vã, de me sujeitar animalescamente a pessoas em que não acredito e uma coisa que sempre me custou três encarnações, foi justamente a proximidade com a minha própria repulsa. Fossem os psicólogos um coelho apodrecido no interior de um frigorífico, ou uma aranha no canto de um quarto e talvez encarasse as minhas oito horas diárias, não como um festival de ingenuidade existencial, atestado pela academia, mas como uma terapia de grupo.

Amanhã, há greve outra vez.

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