quarta-feira, 9 de junho de 2010

 
 
A questão passará muito por aqui: o que eu vejo ao espelho, é o mesmo de sempre. Trago comigo a mesma imagem, como uma nacionalidade que mudando as suas nervuras políticas, demográficas, económicas, continua a ser o mesmo território. Na prática, o facto de não me conseguir ver como me vêem os outros, é uma espreitadela pelo buraco da fechadura. Não deixa ver o quarto todo, mas abre uma possibilidade. Sempre tive algum medo desta coisa do reflexo e da sombra. Ainda hoje, olho para a minha sombra e não entendo muito bem o que deva sentir por ela. Quando era criança, lembro-me bem de sentir muito medo, de não entender porque é que, se existo em carne, tenho de existir em névoa também. Porque é que eu, que só preciso de volume para pesar sobre o chão, tenho de ser pluma para outra qualquer coisa inútil, que não provoca qualquer alteração na minha deslocação pelo mundo. Ter sombra é uma coisa que me dá cabo do juízo. E às vezes, não a ter, também. E ao contrário do espelho, que me dá sempre o mesmo, no mesmo espaço, há tantos anos, a sombra-pluma, parece alterar-se de dia para dia. E isto pode tornar-se uma quase questão ou uma quase curiosidade. Se a minha sombra é o meu reflexo, porque é que não sou opaca quando me vejo ao espelho e porque não furo uns buracos para olhar, quando me viro para trás?

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