terça-feira, 18 de maio de 2010

POLICLÍNICA

O autor coloca os pensamentos sobre a mesa de mármore do café. Longa meditação: aproveita o tempo em que o vidro - a lente com a qual examina o doente - ainda não está à sua frente. Depois, vai retirando os seus instrumentos: caneta, lápis e cachimbo. A multidão dos frequentadores, disposta em anfiteatro, constitui o seu público clínico. O café, servido por mãe solícita e assim saboreado, submete o pensamento aos efeitos do clorofórmio. Aquilo em que pensa tem tanto a ver com a coisa em si como o sonho narcotizado com a intervenção cirúrgica. Fazem-se incisões nas cuidadas linhas da caligrafia, o operador desloca acentos no seu interior, cauteriza as protuberâncias verbais e insere, como se fosse uma costela de prata, uma palavra estrangeira. Por fim, cose tudo com os pontos finos da pontuação e paga ao criado, seu assistente, em numerário.

Walter Benjamin
Imagens de pensamento

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